sábado, 7 de maio de 2011

Dos incômodos (Parte IV)

Passamos pela Álvares Penteado, pela Quintino Bocaiúva, pela José Bonifácio. Agora eu já não sabia o nome da rua em que estava. O centro cinza cobria-se com rostos coloridos e camisetas pretas: de luto. Era tanto barulho, que eu mal conseguia ouvir o que falavam os meus amigos do meu lado. “NÃO VOTEI NELLE”, dizia meu cartaz. (Não havia votado mesmo.) “O BRASIL EXIGE DIGNIDADE”, carregava Carlinhos.

Estávamos na Rua Direita, seguindo para a Praça do Patriarca, quando encontrei, fruto do acaso, Dona Pietra, uma antiga amiga de meu avô. Eles eram bem próximos. Se existia alguém que sabia mais segredos de meu avô do que eu, era ela. Os dois sempre conversavam durante horas no portão de casa e também na padaria da esquina. Sempre sozinhos.

Obedecendo ao impulso, e ao que era mais lógico, me dirigi a ela. Precisava aproveitar a oportunidade. E foi ela quem começou.
- Lara, querida, como está? – pergunta retórica. Com tanta gente nas ruas, entramos em um bar.

- Bem e a senhora?

- Também, querida – respondeu fazendo um carinho em meu rosto – À procura de alguém?

Mais do que eu tentando descobrir algo, parecia que Dona Pietra queria falar.

- Sim. Meu avô – fui direta. – A senhora sabe onde ele está, não? – pausei. Ela não respondeu. Continuei – Já não agüento mais ficar sem notícias. Ninguém na minha casa fala nada. E chego até a acreditar que minha mãe não sabe.

- Sua mãe realmente não sabe de nada, querida. Olhe, - retirou de sua bolsa marrom um pequeno papel e uma caneta – vá até esse endereço – disse enquanto escrevia.

Obedecendo a outro impulso, o que fiz foi pegar o papelzinho, agradecer Dona Pietra e sair o mais rápido possível daquele lugar. Era a oportunidade que eu ansiava por todos esses meses. Não poderia perdê-la.

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